Sagrado Feminino Várias

A Serpente da vida

A serpente em diversas culturas foi vista como sagrada e feminina, representando os ciclos da natureza que se renovam constantemente, as mensagens que surgem do nosso inconsciente e o poder do ventre gerador.

A serpente percorre mitos, mora no ventre da Terra e no ventre humano. As diversas culturas tem dançado com seus quadris, onde mora esta força interna, numa busca instintiva e natural de entrarem em contato com a energia criadora do ventre.

Em várias culturas encontra-se a ouroborus, uma serpente que engole sua própria cauda, simbolizando o rejuvenescimento, a eternidade e os ciclos contínuos de começo e fim.

A serpente de fogo aparece na Índia como Kundaliní. Surge nos mitos indígenas brasileiros, como o do Boitatá, uma cobra de fogo que vive nos rios e lagos, protegendo as matas dos incêndios.

boiuna2                                                                                                                                                                           Boiúna

Temos ainda o mito da grande cobra Boiúna da Amazônia, onde dizem haver uma grande serpente que está sempre se movendo, movimentando as terras e águas do rio. Boiúna, de mboi – “cobra” e una – “negra”, também conhecida como boiaçú , de mboi e açú, cobra grande.É o mais poderoso mito amazônico segundo Câmara Cascudo, fazendo parte do ciclo de mitos d’água, senhora dos elementos, criadora dos animais, do dia e da noite.

O Dragão Oriental, segundo a mitologia chinesa foi um dos quatro animais sagrados convocados pelo deus criador Pan Ku para criarem o mundo, representando a energia do fogo que tudo destrói e tudo transforma.

No Antigo Egito a proteção da nação dependia da força das serpentes. O uraeus, serpente em posição de ataque que aparece nas coroas dos deuses e faraós do Antigo Egito, representam sua realeza, divindade e autoridade. Protegia os templos e simbolizava a imortalidade e soberania, sendo vista sobre a fronte da deusa Ísis, regente do rio Nilo.

uraeustut2

Waddjit  foi uma das mais antigas deusas egípcias cujo culto se iniciou no período pré dinástico,  como a deusa local do Per-Wadjet (Buto), e logo se tornou uma deusa padroeira de todo o Baixo Egito, região do Delta do Nilo.  Seu nome significa “A verde”, cor das serpentes, e “A da cor do papiro”, numa alusão ao papiro, planta do Baixo Egito que teria sido por ela criada e sustentada, assim como seus pântanos.

orange_cobra-1                                                                                                                            Naja arábica

Wadjit era inicialmente cultuada como uma deusa ligada à vegetação tendo se transformado numa deusa da realeza. Representava o Baixo Egito sendo frequente aparecer acompanhada da deusa abutre correspondente  do Alto Egito, Nekbet.

Wadjit surge em algumas passagens lendárias como protetora das crianças e da hora do parto. Quando, por exemplo, Ísis procurava as partes do corpo de Osíris, escondeu seu filho Hórus nos pântanos do Delta do Nilo, sendo cuidado por aquela deusa, que o alimentou com seu leite.

Era representada ainda como mulher com cabeça de serpente e que tem na cabeça a coroa vermelha do Baixo Egito. Aparece também como uma mulher com cabeça de leoa, quando se pretendia aludir ao aspecto de defensora da realeza. Surgia igualmente como uma serpente alada ou como uma cobra enrolada dentro de um cesto de papiros.

wadjethatshepsut2                                               Imagem de Wadjet na parede do Templo de Hatshepsut em Luxor

Na arte egípcia presente nas pirâmides vemos imagens de uma serpente positiva a serviço do divino protegendo o faraó e de uma serpente negativa que deve ser dominada, Apófis, a grande serpente, perigosa e a ser combatida pelo Deus-Sol.

imagem12

A imagem de duas serpentes são vistas na Índia, Pérsia, Grécia e Egito, simbolizando os canais energéticos masculino e feminino ascendendo pela coluna. A mesma aparece no símbolo da medicina, pois na Antiguidade Oriental um médico tinha conhecimentos que iam de Astrologia, à música e conhecimentos dos mistérios humanos e da natureza, assim como o fazem os pajés, um verdadeiro mago. Muitos curavam através da música, por vibrações e frequências usadas corretamente para organizar distúrbios, que eram vistos como uma desafinação do corpo do equilíbrio natural. Mas de toda esta sabedoria das forças vitais quase nada sobrou além do símbolo e uma grande resistência aos conhecimentos das forças naturais.

A Kundaliní, do sânscrito ‘enrolada como uma cobra’ ou ‘aquela que tem forma de serpente’, é uma energia que nasce na base de nossa coluna, no primeiro chakra – Muladhara, localizado na região do períneo.

mulher-sagrada

Muitos movimentos da dança do ventre fazem com que o corpo da mulher ondule em torno de sua coluna, assim como as serpentes o fazem na terra, remetendo também à subida da Kundaliní do chakra básico com as movimentações de quadril, passando pelos chakra umbilical e esplênico com os movimentos abdominais.Os movimentos de busto abrem o chakra cardíaco e fluem para os braços e mãos, subindo aos chakras superiores com as movimentações de pescoço e cabeça.

A dança do ventre estimula também a libido adormecida na base da coluna, a mesma que quando canalizada ascende pela coluna e revitaliza todos os órgãos, podendo-se experimentar estados diferentes de consciência, de conexão consigo mesma e abertura dos chakras superiores.

Representações de serpentes aparecem desde a Pré-história e em diversos povos, ligadas à geração da vida, a essência dos seres e à libido. Na Mesopotâmia, os caldeus usavam a mesma palavra para vida e serpente. Em árabe , serpente é El-hayyah e vida El –Hayat , ambas vindas de um nome divino que significa aquele que vivifica.

Entrar em contato com a energia da serpente nos traz vitalidade e a possibilidade de mudanças de padrões e atitudes. Sua força de cura é compreendida e estudada em algumas correntes espiritualistas, no Yoga e no Tantra. O trabalho cuidadoso com o ventre revitaliza nossos órgãos e a saúde.

serpente-1

No Gênesis a serpente foi colocada como uma força maléfica e de aspectos negativos e com o fortalecimento da Igreja essa imagem foi associada às mulheres, como Eva, onde a sedução foi colocada como demoníaca. A sedução e o sexo tornaram-se pecaminosos, perigosos e até mesmo destrutivos. Desta forma ela permanece bloqueada nas mentes e corpos dos que vivem nessas sociedades, tornando-se a origem de muitas doenças e disfunções do corpo e mente humana.

As mulheres associadas às serpentes por acessarem seus dons naturais sofreram perseguição e morte. Seus ventres deveriam permanecer controlados e anulados, para que nenhuma força consciente brotasse deles. Muitos dos conflitos atuais são uma reverberação conjunta da repressão de cada ventre, da falta de contato com seus elementos vitais e com as forças naturais.

il_430xn-70190066

Na dança, o ventre pode ser trabalhado como centro de consciência e de reorganização energética. Entendendo a sacralidade do ventre, desenvolve-se o amor próprio e o respeito por si mesma, seus sentimentos e momentos de vida. A movimentação da pelve ajuda a massagear os órgãos internos, fortalece e dá mobilidade às pernas, coluna, tronco e músculos do corpo. Os movimentos tornam-se mais leves devido aos movimentos sinuosos desbloquearem as articulações.

Mulheres que dançam de forma consciente seus ventres se conhecem melhor, podem acolher a si mesmas, entendendo seu ser num mundo onde seu feminino é constantemente reprimido por uma sociedade competitiva, assentada num masculino desequilibrado.

O ventre guarda o princípio da vida. O homem compreende a vida através da mulher. Para que isso aconteça a mulher precisa conhecer-se, amparar  sua serpente , ouvir suas experiências internas que serão capazes de transformar a sociedade atual.

Todos os seres vivos passaram por um ventre e já tiveram o conhecimento primitivo dessa força e seu mistério. Esta serpente, vivente em mitos no mundo todo precisa ser levantada, para que conheçamos o dito mistério da vida e a nós mesmos.

Texto: Diana Arássad, arte-educadora formada pela FADM, bailarina e professora formada pelo Método Acadêmico Suheil de Ensino. Arte-terapeuta formada pela UCAM. Estudiosa das culturas e espiritualidade no mundo, em especial a Umbanda.Participa de grupos de Tantra e círculos de sagrado feminino.

Referências:

Dance e recrie o mundo – Lucy Penna

http://pt.fantasia.wikia.com/wiki/Boi%C3%BAna

http://www.crystalinks.com/wadjet.html

http://ponteoculta.blogspot.com.br/2012/09/a-barca-de-ra-vi.html

http://www.fascinioegito.sh06.com/textopir.htm

Além das experiências próprias…

Comentar

Clique aqui para comentar