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Dançando o Brasil – X Aldeia Multiétnica na Chapada dos Veadeiros

X Aldeia Multiétnica na Chapada dos Veadeiros

A X Aldeia Multiétnica ocorrida entre os dias 15 e 22 de julho de 2016 na Chapada dos Veadeiros, à beira do rio São Miguel , é um encontro anual de várias etnias indígenas brasileiras onde aprendemos com eles sobre suas culturas , suas histórias, pinturas, ritos, artesanatos e seus saberes.

Nessa minha busca em conhecer de perto essa sabedoria ancestral indígena, participei de vivências na X Aldeia, aprendendo sobre seus cantos, suas danças, suas pinturas corporais, suas formas de reverenciar e entender o mundo.

No Brasil, o termo “índio” generaliza várias culturas como se fizessem parte de um grupo onde todos são idênticos, o que não é verdade, ocorre que no país temos mais de 230 etnias indígenas, cada uma com sua língua nativa, costumes, artesanatos e ritos.

A viagem foi cheia de aventuras, trocas de costumes e ideias, e a locomoção foi via carona solidária.

Chegando na Aldeia, logo de fora avistei um belo grande penacho se movendo. Era como ver o meu povo da Jurema em terra e isso me trouxe uma grande emoção desde o portal de entrada. O povo das matas estava ali, representado pelos Krahô (TO), Yawalapiti – Alto Xingu (MT) – Guarani Mbya e Avá-Canoeiro, Kayapó – Mebêngôkré (MT- PA), Dessana (AM), Xavante(MT) e Fulni-ô (PE).

Tenho muito de ficar encantada com as coisas e logo me vi em frente a todo artesanato indígena com os olhos de criança. As primeiras artes que vi foram as do povo Funil-ô (PE) que me encantaram com seus penachos logo na entrada.

Em poucos minutos comecei a ouvir um outro dialeto, eram os Fulni –ô conversando entre si, ao mesmo tempo em que um deles me explicava em português sobre os materiais utilizados em seus artesanatos.

No Nordeste apenas o povo Funil-ô conseguiu preservar viva e ativa a sua língua nativa – o Yaathê (Ia-tê), bem como o ritual Ouricuri, que é realizado sob grande sigilo.

Andei por toda a Aldeia e foi nesse primeiro povo que senti vontade de retornar  e adquirir minha tiara de penas, que mais que um adorno, carrega para mim todo um significado de história dos nossos ancestrais brasileiros, de um colorido fundamentado em cada elemento ali colocado, traz um pedaço de minha espiritualidade, das forças que sustentam as nossas matas nos planos físico e astral, das forças dos caciques e pajés, das forças da Jurema e dos guerreiros flecheiros!

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Foto com o povo Funil-ô na X Aldeia Multiétnica

O artesanato de todas as etnias presentes é bem colorido, tendo como base penas de pássaros diversos, sementes, madeiras, pigmentos naturais extraído de plantas, sementes e frutos.

Os instrumentos musicais usados nos rituais também são feitos de materiais naturais, como as flautas sagradas feitas de madeira, pintadas e adornadas com penas e gravações na madeira. O Uruá é uma flauta utilizada em diversos rituais , como o Kwarup, a despedida dos mortos, realizada pelo povo Yawalapiti.

Os maracás feitos de sementes e cabaças secas desenhadas com grafismos, fazem parte das celebrações e dos ritos das aldeias. Para os Avá-Canoeiro o maracá é de grande importância no ritual de plantação, pois sem seu som as plantas novas não podem crescer. O termo “Maraca” e “maracá” são oriundos do tupi mbara’ká. O maracá é um instrumento que aparece tipicamente nas danças latino-americanas, pela presença da cultura indígena em sua musicalidade. Está presente nas manifestações culturais brasileiras, como o carimbó e em cerimônias de religiões afro-brasileiras que receberam bases indígenas, como o candomblé de caboclo. No catimbó, culto de origem indígena amplamente influenciado por tradições europeias, o maracá é tido como sagrado.

Vi durante as cerimônias a presença dos chocalhos de pé feitos de caroços de pequi ou sementes de jatobá, que dão um som semelhante ao de águas correntes ou de chuva e os apitos que imitam sons de pássaros, feitos de materiais semelhantes aos das flautas.

DSCN4155 -2Foto com as mulheres Yawalapiti na Aldeia Multiétnica

Alguns caroneiros contavam que as etnias estavam fazendo troca de materiais entre si, comparando isso com troca monetária. Comentei que para mim essa troca de materiais entre grupos tem um sentido muito mais amplo. Você estar trocando objetos que foram feitos pelas suas mãos ou de pessoas da sua família, escolhidos seus materiais com todo um respeito e significado dentro de sua cultura, é algo muito maior do que uma troca de produtos. Você está doando uma parte de seu povo para outro e recebendo a do outro e achei muito bonita essa troca que o “povo branco” não estava enxergando. Eu vi como estar dando uma parte sua para o outro, cheia de significado e que não teria um valor monetário para isso. Acolhendo o outro e doando o seu, uma troca respeitosa de saberes, de cultura e de entendimento da suas tradições.

Continuando a caminhada, mais adiante admirei as pinturas corporais, que diferem de um povo para o outro, indicando posições dentro de sua aldeia, se possuem idade para casar por exemplo, representações nos ritos, estado de espírito e sentimentos que podem ser modificados através das pinturas.

As mulheres Yawalapiti, povo do Alto Xingú, era a maior presença nessa tarefa pintando os corpos de pessoas presentes com desenhos diversos. Observei as pinturas que faziam com a tinta negra do jenipapo. Elas me explicaram como é feita a preparação da tinta, como a aplicavam no corpo  e o que representavam os desenhos feitos na pele.

As pinturas femininas se diferem das pinturas masculinas e representam símbolos de animais silvestres, como borboletas, sucuris e peixes. As tintas são feitas de extratos naturais de jenipapo e de urucum, que eles mesmos produzem.

DSCN4157 -2Pintura de rosto feminina Yawalapiti – Fotografia: Diana Arássad

Para fazer o traçado elas usam filetes de caule de árvores como a palmeira tendo a função de pincéis e o resultado final é muito bom!

Um dos irmãos Yawalapiti também estava fazendo pinturas com urucum e ele me explicou como é procedimento feito por eles para obter a tinta vermelha (que eu já havia tentado fazer em casa e não tinha dado muito certo), enquanto pintava os olhos de uma participante da vivência.  Logo foi a minha vez de ter os olhos pintados com o pigmento vermelho por suas mãos.

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A pintura dos olhos foi feita com os dedos mesmo, perguntei pra ele se o urucum iria arder os olhos e ele me respondeu um pouco surpreso com a pergunta:

– Depende da saúde da pessoa!

Então nós sorrimos e eu precisei de um tempo usando o urucum para saber a resposta! 😀

O líder Anuiá em entrevista concedida à rádio EBC fala sobre as pinturas corporais do povo Yawalapiti, sua relação com o colorido, a música e a dança, ao som da flauta típica Yawalapiti. Confira o áudio e continuem a viagem comigo nos próximos artigos!

Fontes:

http://radios.ebc.com.br/radios-ebc/edicao/2014-07/encontro-de-culturas-conheca-os-coloridos-e-musicais-yawalapiti

https://pib.socioambiental.org/pt/povo/yawalapiti

http://www.mundopercussivo.com/estudos-e-pesquisas/conhecaosinstrumentos/maraca/

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